Retorno ao Cipó Cearense

Esse primeiro final de semana do ano foi inaugurado em grande estilo. Mais uma vez tive a oportunidade de escalar no pico cearense de maior potencial para a escalada esportiva, e na minha opinião, o melhor pico do estado.  Tejuçuoca é para nós aqui do Ceará como o nosso Cipó. A rocha é fantástica, um calcário macio e cheio de agarras com muitas paredes ainda virgens, que com certeza guardam potencial para vias difíceis. A trilha é tranquila, uma caminhada fácil até os setores com base perfeita. A estadia é ótima, com quartos com camas, café da manhã e janta servidos pontualmente antes de sair e quando voltamos. Em resumo, sem igual no estado. Essa foi minha terceira vez no pico, um número ridículo de visitas para o potencial que o lugar oferece, algo que pretendo corrigir esse ano com mais trips para lá, tentando levar gente nova que possa contribuir com o pico.

A ideia de mais essa trip para Tejuçuoca surgiu quando a amiga da Paraíba, Janine Falcão disse que viria passar uns dias por aqui no começo de janeiro e queria escalar. Não pensei duas vezes em sugerir Teju, e aos poucos fomos fechando os bondes. Na sexta de manhã, dia 03, saímos de Fortaleza no primeiro bonde, eu, Janine, Dennis, Alex e Vinicius, primo do Dennis.

A caminho com a pedra ao fundo

Chegamos em Teju por volta das 10h30 e não esperamos muito pra começar a escalar. Meio dia já estávamos no setor do Lopes, apresentando o calcário de Teju pra galera. Dos que estavam ali só eu e o Alex já haviam ido antes. Resolvemos iniciar nossas brincadeiras por algo facinho, a via Las Chicas, um quarto grau bem tranquilo.

Depois disso Dennis e Janine foram tentar a Aqui só lá em Bagdá, um quinto grau, e eu e o Alex fomos dar uns pegas na Anti-horário, que estava cotada como 7a. Entrei equipando a via e realmente me senti muito bem escalando, sem sentir nenhum incomodo no ombro direito, que me assombra desde o meio do ano passado. Cheguei no crux sem problemas, mas acabei caindo na hora de dominar a última agarra, um bico de pedra esquisito que de baixo parece bem melhor do que realmente é. Tentei isolar o lance, mas mais um vez não encaixei na agarra e desci.

Na Anti-horário 6sup

Alex entrou em seguida e foi muito bem, caindo apenas no mesmo lance. Mas no processo, acabou achando uma agarra bem melhor do a que eu havia usado, o que parecia melhorar bastante o lance. A Janine já havia descido da outra via e veio tentar também. Um pega, mais alguns betas, e nada de cadena. Era minha vez de voltar. Juntei todos os betas na cabeça e encadenei sem problemas na segunda entrada. Mas com os novos betas ela não me pareceu mais 7a, assim como pro Alex e a Janine também. Resolvemos deixar nossa sugestão no 6sup mesmo.

Como a face desse setor é voltada para o Sul, nessa época passa o dia no sol. Logo escalar por lá ao meio dia deu uma drenada na força, que já estava pequena devido a noite mau dormida no dia anterior. Me dei por satisfeito com a cadena da Anti-horário e parei por ali.  O pessoal ainda deu uns pegas na André Braga, outro 6sup mas com mais cara de 7a, antes de finalizar os trabalhos. Mas antes de voltar pro abrigo eu resolvi dar uma olhada no que parecia ser uma parede que existia por trás da que estávamos escalando, e que era visível através de um buraco grande na parede. Achei que fosse ter uma entrada muito escondida, mas me surpreendi em achar a entrada para um novo setor a apenas cinco metros de onde estávamos. E que setor! Uma pequena furna, completamente na sombra, com paredes na faixa dos 15 metros de altura, com várias opções.

No sábado acordamos cedo e já tínhamos a companhia do segundo bonde que chegou na madrugada, formado por Davi, Jessica, Vanessa e Iale. Tomamos nosso café especial preparado pela dona Teté e já servido pontualmente às 7h e saímos de novo para os setores escalar mais uma vez. Voltamos mais uma vez ao setor do Lopes, e desse vez a brincadeira pra mim começou na Nas Carreiras, outra via cotada como 7a. Dessa vez o Alex equipou e foi bem até a antepenúltima chapa, de onde desceu e eu fui tentar completar. Mas quem disse que eu consegui sequer fazer a virada pra uma canaleta que tem no começo da via? Travei total e não venci o lance, passando a vez pra Janine, que passou sem problemas me possibilitando visualizar o beta. Ela também foi bem, equipou o restante, mas com algumas quedas. Davi entrou em seguida, e todos achávamos que ia sair cadena à vista, já que ele está numa boa fase. Mas que nada. A viazinha fechou a cara pra ele também, que acabou roubando na árvore lá em cima. Alex deu mais um pega sem sucesso e era minha vez de novo. Juntei mais uma vez os betas de todo mundo e fui. Passei o lance da canaleta sem problemas e segui até os lances mais difíceis acima, que ainda não tinha feito, onde encaixei muito bem, e mesmo um pouco cansado consegui descansar onde dava e ir até o final, encadenando mais uma via, essa sim um 7a. Davi também entrou em seguida, conseguindo também a cadena.

Depois disso fomos conferir o novo setor e o Davi logo escolheu uma linha pra abrir. Fiquei na segurança enquanto ele fazia os dois primeiros furos na via, mas tivemos que parar por ai, pois a furadeira estava com a bateria fraca. Ia ter que ficar pra o domingo finalizar a primeira via do setor.

Davi iniciando os trabalhos na nova via

O sábado de noite foi bem agradável, com o Iale e o Davi se revezando no violão e todo mundo cantando junto, tomando uma cervejinhas, conversando e aproveitando o céuzão estrelado que só o interior proporciona. Ficamos por ali até mais ou menos meia noite, e ai o cansaço começou a bater e todo mundo foi indo se recolher. Domingão começou meio nublado e preguiçoso, mas não ia demorar pro sol aparecer queimando tudo de novo. Tomamos café e saímos o mais cedo possível, já que o dia ia ser curto.

O destino da manhã foi o setor dos tetos, que é o que existe de mais impressionante em Teju. Uma parede que deve ficar entre os 35 e 40 metros de altura, com trechos bem negativos e dois grandes tetos no final. Por enquanto as vias ali são poucas e não chegam nem na metade da parede, já que ninguém por aqui tem cacife pra se aventurar abrir uma via naquele terreno negativo. Começamos os trabalhos do dia pela Minha primeira vez, um 7b bem técnico de bastante posicionamento, de agarras abauladas.  Alex entrou primeiro pra equipar, e a Janine entrou em seguida. Entrei para dar um pega e fui até bem, mas a via exigia bastante do ombro e senti um pouco o esforço. Fiz com algumas quedas e desci, passando a vez para o Davi.

Enquanto isso a Jessica entrava na Preá, uma via fácil, mas como era de proteções fixas mistas e ninguém sabia disso, ficou complicado. A Janine até conseguiu fazer a via inteira, laçando tudo que era raiz e tronco de árvore no meio do caminho, mas foi meio que um perrengue deixar o top armado para os outros tentarem. Dos tetos voltamos para o Lopes, onde o Davi ia continuar a conquista da via com o Iale, e a Jessica e a Vanessa ia fazer a Aqui só lá em Bagdá. Como eu e o Alex saímos dos tetos depois deles, aproveitamos para dar uma volta pelo mato e tentar ver outras paredes virgens para conquistas futuras. Nem precisamos andar muito pra achar coisa incríveis e ainda tem muito lugar pra explorar por ali.

Uma "panorâmica" de uma das muitas paredes virgens do lugar

Voltamos a ponto de ver o Davi fazendo o último furo na via, que ganhou o nome de Cuidado com essa machado. O Iale que ajudou no final da conquista ganhou a incumbência de fazer o FA, mesmo tendo começado a guiar apenas nessa trip. E não é que ele tocou até em cima, à vista e escalando muito bem? Diga-se de passagem, o Iale se destacou nessa trip escalando muito bem, mesmo com o pouco tempo de rocha. O Davi ainda queria mais uma opinião do grau e eu acabei entrando rapidinho pra sentir a graduação, e confirmei a sugestão do Iale, um 5sup bem divertido. A passagem final para a parada ficou um pouco desprotegida e vai precisa de uma chapa intermediária, mas fica pra próxima trip.

Voltamos para o abrigo com a sensação de dever cumprido, forramos o bucho com o belo almoço que já estava nos esperando e tomamos o caminho de volta pra Fortaleza, já combinando de voltar lá no carnaval, para quem sabe povoar um pouco mais o lugar de vias e tornar esse pico cada vez mais o destino da escalada esportiva no ceará.

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